Sunday, June 16, 2013

No início da minha adolescência tinha ataques de ansiedade. Tudo começava com um problemazinho qualquer, uma coisa mínima, sem importância nenhuma, que eu sobrevalorizava e achava que não ia ter solução (os adolescentes pensam assim, muitas vezes). O problema é que, sem eu dar conta, começava a pensar em tudo o que podia correr mal, a todos os níveis. O meu problema deixava de ser aquela questão pequenina inicial, mas passavam a ser todas as questões possíveis e imaginárias. Nessa altura começava a hiperventilar, deixava de sentir as mãos e os pés e a ponta do nariz, começava a sentir a cabeça a andar à roda e, se não me deitasse e me acalmasse caía para o lado. Demorei muito tempo a perceber o que se passava. Fiz exames a tudo e mais alguma coisa, até se perceber o que era. Quando se soube fui encaminhada para um psicólogo, que entre outras coisas me ensinou a controlar os meus pensamentos, a não deixar que o pânico se instalasse. Foi nessa altura que me ensinou a imaginar que estava noutro sítio, um lugar que varia de pessoa para pessoa mas que, segundo ele, costuma ser algo como uma praia. E foi assim que comecei a saber lidar com o stress. Quando a minha cabeça começava a ficar cheia de problemas fechava os olhos e imaginava-me sentada na areia, numa praia em fortaleza ao final da tarde, com o sol a dar-me nas costas e uma aragem mais fresca a levantar ao de leve os meus cabelos. Por estranho que pareça, resultava. No início não era muito fácil, mas passado pouco tempo já conseguia chegar àquela praia quase instantâneamente. 

Os anos passaram e deixei de precisar disso. A minha adolescência acabou, tornei-me uma pessoa mais segura, menos pessimista, aprendi a controlar a minha cabeça e a rir-me quando começo a exagerar. Não sou uma pessoa ansiosa, nunca mais fui a um psicólogo e de vez em quando até me esqueço que algum dia fui assim. Numa das tardes que passei em São Tomé, por razão nenhuma, lembrei-me dessa história. Estavamos a voltar de um dos nossos passeios de domingo à tarde, nesse dia ao norte. Tínhamos as janelas abertas para não ligarmos o ar condicionado, e o calor ainda se fazia sentir. Não me lembro ao certo do que tinha vestido, mas era manga cava, e o sol aquecia-me o ombro esquerdo, de uma forma estranhamente agradável; tinha o cabelo solto, que voava apesar da baixa velocidade (quem conhece São Tomé sabe que ir a 60 km/h já é uma aventura). O Yu mudou a estação de rádio, e a 'She will be loved' começou a ressoar. Calámo-nos e assim ficámos até ao início do refrão, altura que as nossas vozinhas estridentes se juntaram à música. E foi aí que me lembrei de tudo o que vivi. Pensei quão incrível era alguém que outrora via o que podia correr mal em tudo estar ali, naquele país, num carro de um amigo que conhecia há uma dúzia de dias, a percorrer estradas esburacadas, vistas que não lhe diziam nada, mas que lhe traziam um sentimento tão aconchegante. E senti uma felicidade tão grande que não soltei uma lágrima por pouco. E senti uma felicidade tão grande que decidi: se algum dia voltar a precisar de um lugar para onde me transportar quando a minha cabeça começar a ficar demasiado cheia, é para este momento que venho. E, embora ainda não tenha precisado, de vez em quando volto lá. Fecho os olhos e volto a viver aquele momento: o sol a aquecer-me o ombro, o cabelo a voar, o Yu a mudar de estação, a 'She will be loved', as nossas vozinhas estridentes e as gargalhadas de todos assim que a música acabou. E nesse momento sou muito, muito feliz. 

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