Sunday, September 28, 2014

Há que ser coerente.

Não acredito no destino, nos astros, nos signos, nos desígnios, numa entidade superior ou em qualquer outra coisa que não a capacidade que temos de decidir fazer isto ou aquilo, optar por A em vez de B. Mas adoro a balada astral do Miguel Araújo com a Inês Viterbo. Não acredito no amor para sempre, na expressão "o meu mais-que-tudo", "cara-metade" e tantas outras. Mas quero para mim o que os meus avós tiveram. Não acredito em amor à primeira vista, blind dates e outros que tal. Mas inscrevi-me no tinder.

A questão é: não sou coerente. Sei aquilo em que acredito, sei os valores que tenho, e sei que nem sempre ajo de acordo com eles. Quero ser cirurgiã (e trabalhar todos os dias a maior parte dos dias), mas quero ter 4 filhos e passar tempo de qualidade com eles. Não sou coerente. Tenho 24 anos e às vezes ainda me comporto como uma adolescente de 15. E ainda dizem que sou demasiado crescida para a idade que tenho...
Se estiverem interessados em alguém que está a estudar para o Harrison aproveitem, que é para a vida. Nunca vão ver essa pessoa tão mal como ela está agora: nem com tão pouco tempo livre, nem com tão pouca paciência, nem com as sobrancelhas por arranjar durante tantos meses, a maquilhagem por usar, nem a comer tanta porcaria como a que come agora.

Por outro lado, se estão a estudar para o Harrison talvez não seja a melhor altura para se interessarem por alguém: essa pessoa não sabe que vocês não têm sempre tão pouco tempo livre, tão pouca paciência, tanto pêlo e tão pouco brio.

Pronto, era isso. Agora vou ali tomar um duche, que felizmente isso ainda faço diariamente.


Monday, September 22, 2014

Nos dias como o de hoje ainda tenho saudades dele.

Saturday, September 20, 2014

Faltam 2 meses.

O estudo intensivo tem-me ensinado muito para além do que vem no livro. Aprendi que as pessoas mudam e crescem (às vezes em sentidos opostos), e que isso é normal, porque hão-de aparecer outras pessoas a mudar e a crescer no mesmo sentido que nós. Aprendi a gerir prioridades e a não me deixar sufocar (ainda estou a aprender isto, na verdade). Aprendi que todos temos um bocadinho de loucura dentro de nós, à espera do momento ideal para se revelar. Aprendi a escolher o melhor lugar da biblioteca (não, não vos digo os meus critérios!). Aprendi que às vezes compensa dormir menos 20 minutos para ter tempo para tomar o pequeno-almoço na esplanada e começar o dia com gargalhadas embora o dia nos reserve 10 horas de desespero. Aprendi a ser flexível com os meus planos, a ser flexível com o meu lugar, a ser flexível com o meu material de estudo... Na verdade isso não aprendi, mas aprendi que devia aprender isso (conta, certo?). Aprendi a importância de partilhar os meus medos com alguém, mesmo aqueles que eu não sabia que tinha. Aprendi a prepara refeições para uma semana inteira! Aprendi que existe um mercado negro de marcadores stabilo boss.  Aprendi a fazer mais gestos bonitos pelas outras pessoas. E estou a tentar aprender a ser um bocadinho feliz todos os dias.

Como podem ver estou a aprender muita coisa que não vem para o exame. Vamos esperar que tambem esteja a aprender alguma coisa que venha. 

Tuesday, September 9, 2014

Tiro 3 dias de férias, que se somam aos 4 dias tirados no início de Julho e que perfaz um total de 7 dias desde o início de Janeiro. Abro as bibliotecas todas as manhãs, fecho-as em alguns dias, noutros estou em casa à hora do jantar para dar uso à secretária que tenho no quarto. Já lá vão 2 meses e meio de estudo intensivo, 10 meses se contarmos o tempo em que o dia foi dividido entre estudo e estágio. Ando de mochila às costas, o conhecimento a pesar figurativa e literalmente, as costas curvas para suportar o peso dos livros. Revejo tabelas no metro, post its com as manifestações, as alterações genéticas e o prognóstico de doenças que nunca vi, e das quais nunca tinha ouvido falar até este livro surgir à minha frente. Pelo meio mantenho a família, que liga de vez em quando para saber se está tudo bem, o meu pai a perguntar 'então, já sabes tudo?' uma e outra vez e eu sem coragem para dizer que tudo nunca se sabe. Caminho com outros tantos ao meu lado, todos no mesmo barco, todos agarrados ao bote salva-vidas que nos mantém à superfície e não nos deixa afogar no meio das lágrimas que correm com a terapêutica do mieloma múltiplo. Preocupo-me por 1 milésimo de segundo com o futuro mas rio assim que a senhora do banco me fala nas vantagens que virei a ter quando receber 3000 euros de ordenado (mas ela sabe que eu vou só ser médica?); lá lhe peço que me fale nas vantagens para quem recebe os 1200, porque é isso que me interessa, que é isso que hei-de receber durante muito, muito, muito tempo. Trato de papelada e desembolso 210 euros para me inscrever na Ordem, 'só começa a pagar quotas no próximo ano!' - obrigadinha pelo favor! Abro uma notícia qualquer com médicos no título e somos todos iguais, uns sacanas, uns gatunos que recebem 8000 euros por mês e juntam o privado e o público e não põem os pés no hospital e não querem saber dos doentes para nada. Rio-me com o rótulo que me foi posto ainda sem ter começado sequer a trabalhar, viro a página e tento a todo o custo decorar a lista de supermercado de causas de hiponatrémia, como é possível saber isto quando há 6 anos essa palavra nem existia no meu dicionário? Respiro fundo e digo a mim mesma que um dia esta informação pode ser útil (ou não.). Que esta foi a minha opção, e que não importa a quantidade de insultos, onde me sinto mesmo feliz é dentro de um bloco operatório, com as mãos na massa a arranjar uma solução para os problemas, mesmo que para isso tenha de estudar a maior parte do dia para um dia poder trabalhar a maior parte do tempo e receber 1200 euros que aos olhos dos outros são 8000. Respiro fundo e só peço que o trabalho compense. Porque estou cansada e já não tenho a certeza de ter forças de fazer isto tudo de novo no próximo ano, e talvez até nem fosse infeliz a trabalhar das 9 às 5 num sítio qualquer que não me fizesse o cabelo cair com o stress.